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“Fraternidade e educação: fala com sabedoria, ensina com amor”
Todos nós sonhamos com uma sociedade mais justa, fraterna, com a expressão do respeito da dignidade da pessoa humana. Falar em fraternidade nos remete ao ideário da Revolução Francesa — liberdade, igualdade e fraternidade, que devem andar de mãos dadas. A igualdade garante a segurança de todos, sem necessidade de supressão da liberdade. A fraternidade… ah!… Como falar em fraternidade com a gritante diferença entre as classes e os indivíduos, o desrespeito entre os povos, a exploração do ser humano — “escravidão” —, a falta de empatia, a violência instaurada de todas as formas, a injustiça predominante, o egoísmo nas relações sociais e as condições desumanas de vida?
Indiscutivelmente, todos nós — todos — temos o compromisso de trabalhar por um mundo mais justo, mais equânime e fraterno… Assim, teremos pessoas pensantes, corajosas e livres sem temer outro ser humano.
Certamente, o caminho para se chegar a um “mundo melhor” é através da Educação. A educação escolar possibilita formar cidadãos “melhores”, com empatia, por meio do cuidado com o outro; oportunizando a fala, a voz — muitas vezes sufocada; desenvolvendo o pensamento crítico-reflexivo; possibilitando a escuta — atenciosa e amorosa — a partir da conversação, da mudança de mentalidade e de comportamento; desbravando o caminho do desenvolvimento pessoal e do meio em que está inserido.
A educação escolar tem um papel fundamental na construção do sujeito que será o futuro — a nova geração —, onde seus integrantes serão os futuros líderes. A educação escolar apresenta não só a função de formar — educação formativa —, mas de educar. Portanto, deve ser uma educação com amorosidade, dando espaço para lugar de fala, de pensamento, de crítica reflexiva. “Escola: lugar de fala e de amorosidade.”
Para Paulo Freire (1996, p. 11), a amorosidade na educação transita pelo diálogo aberto, instituindo-se a empatia recíproca, instigando-se, assim, a troca de saberes, promovendo o diálogo reflexivo e crítico. Na relação entre estudante e professor, a amorosidade pode proporcionar vínculos afetivos e uma identificação com o outro, reforçando a relação de ambos. “Fala com sabedoria, ensina com amor.”
[…] na convivência amorosa com seus alunos e na postura curiosa e aberta que assume e, ao mesmo tempo, provoca-os a se assumirem enquanto sujeitos sócio-histórico-culturais do ato de conhecer é que ele pode falar do respeito à dignidade e autonomia do educando. Pressupõe romper com concepções e práticas que negam a compreensão da educação como uma situação gnoseológica.
Para aprender, é necessário um ambiente de respeito, de parceria, de liberdade… e esta é essencial ao desenvolvimento intelectual do ser humano, pois um espaço de aprendizagem engessado inibe e limita o saber. Não é possível aprender sem troca afetiva, em que o medo e a insegurança fazem parte do processo educativo. Uma educação autoritária e egoísta impede a autonomia do aprendente, delimita a curiosidade, o prazer pela descoberta. Somente nas práticas em que autoridade e liberdade se afirmam e se preservam enquanto elas mesmas, portanto no respeito mútuo, é que se pode falar de práticas disciplinadas como também de práticas favoráveis à vocação para o ser mais.
Para Freire (1996), a amorosidade é algo subjetivo, mas se traduz no ato ético de respeitar e incentivar a autonomia e a dignidade humana. Certamente, é algo que se deve expressar. Pela habilidade da fala, evidenciam-se as emoções e se compartilha o saber. Para Marchuschi (LEAL; GÓIS, 2012), “O homem pode ser definido como um ser que fala, e não como um ser que escreve”. Escola é um lugar de fala e de amorosidade.
A fala deve também ser desenvolvida na escola. Há mais de duas décadas, os Parâmetros Curriculares Nacionais, de 1997, e a Base Nacional Comum Curricular, de 2018, ressaltam a necessidade de “[…] a escola ensinar o aluno a utilizar a linguagem oral nas diversas situações comunicativas” (PCN / LP, 1997, p. 320); de “[…] possibilitar a participação significativa e crítica nas diversas práticas sociais permeadas/constituídas pela oralidade, pela escrita e por outras linguagens” (BNCC, 2018, p. 66). Quando falamos que a escola é um lugar de fala, estamos falando de espaço de expressão, de voz, de legitimação do sujeito, de possibilidades. “Fala com sabedoria, ensina com amor.”
A oralidade, nesse sentido, precisa adentrar o espaço escolar como objeto de ensino e de desenvolvimento humano, com o sentido de construção do eu em seu espaço sócio-histórico-cultural, e não simplesmente no âmbito da oralização (fluência, ritmo, entonação) ou como pretexto para o desenvolvimento de habilidades outras (explicação, argumentação em diversas situações escolares).
Para Marcuschi (LEAL; GÓIS, 2012), a oralidade a ser trabalhada no espaço escolar deve ser, sobretudo, a que favorece o desenvolvimento da proficiência do aprendiz em gêneros orais formais públicos, ou seja, em gêneros que circulam em contextos de uso linguístico.
Certamente, o caminho para se chegar a um “mundo melhor” é através da Educação.
Para aprender, é necessário um ambiente de respeito, de parceria, de liberdade… e esta é essencial ao desenvolvimento intelectual do ser humano, pois um espaço de aprendizagem engessado inibe e limita o saber.”
Certamente a proficiência a que Marcuschi (LEAL; GÓIS, 2012) se refere remete ao uso da oralidade nas práticas sociais em que se promove o desenvolvimento do uso da fala, então o “[…] uso da modalidade oral da língua em práticas sociais e discursivas”. No que tange às práticas sociais na escola para desenvolver a fala e a voz do sujeito, é necessária uma intencionalidade dos educadores — esta que deve ser comunicada aos educandos — que, no contexto escolar, constitui-se através de planejamentos/planos para o docente e o discente. É importante ressaltar que pensamento e linguagem se articulam no processo de desenvolvimento, assim, o professor, com respeito à autonomia e à dignidade de cada estudante, contribuirá para o processo de compreensão dos códigos linguísticos e da formação do sujeito humano, também social e protagonista de sua aprendizagem.
O professor, numa postura de aprendente-ensinante, compromete-se como sujeito dialógico em constante crescimento e aprendizado com as diferenças; assim, a amorosidade se constitui como elemento importante no processo educativo. Numa relação não autoritária, fica mais fácil para os estudantes despertarem para o mundo e descobrirem sua verdadeira vocação.
A educação é entendida como parte fundamental para a formação do sujeito, para a cidadania e também para a libertação, onde transita pela práxis, vivências e entendimento de mundo. Desse modo, oportuniza-se desenvolver o intelecto e compreender melhor o mundo, tornando os sujeitos autônomos e emancipados.
Considerações Finais
Educar com amorosidade é proporcionar condições de ensinagem e aprendizagem, é acreditar que os estudantes podem se tornar seres livres para escolher, criar, participar efetivamente da própria vida, assumindo seu papel no mundo por meio da afetividade e do respeito. Desse modo, através da palavra e da ação, a escola tem a função de difundir saberes, e os educadores precisam, através da amorosidade, manter a esperança da transformação da realidade desses indivíduos.
No ensino, quando orientado na práxis pedagógica, os sujeitos que pertencem a diferentes contextos sociais se envolvem comprometidos com os seus saberes. Desse modo, há uma possibilidade de construção da práxis da amorosidade, que permeia a troca de afetividade e de saber. Existe muita beleza no processo educativo, nas descobertas, na possibilidade de se expressar, de pensar, de reproduzir o que apreendeu, e essa beleza repousa no ato de amor que se constrói.
Amorosidade e autonomia se constituem como a base da educação, uma aprendizagem no cotidiano pautada na formação, no conhecimento e na interação — processo da natureza educativa. Educar é ação de construir conhecimento, de desenvolvimento do ser, e o professor, ao orientar o aluno, faz uso das diversas ferramentas pedagógicas e interage com a história de vida e a cultura de cada indivíduo. Oportunizar as interações em sala de aula, sem dúvida, promove o desenvolvimento das potencialidades.
A educação é entendida como parte fundamental para a formação do sujeito, para a cidadania e também para a libertação, onde transita pela práxis, vivências e entendimento de mundo.
[Rosangela Nieto de Albuquerque – Revista Construir]